Não obstante o decidido pelo E. Superior Tribunal de Justiça – STJ, nos autos do Recurso Especial nº 1.221.170/PR, muitas dúvidas ainda permanecem sobre o correto conceito de “insumos” para fins de apropriação de créditos de PIS e COFINS.
Como sabido, em 22 de fevereiro de 2018 o STJ concluiu o julgamento do leading case respeito do tema, veiculado no acórdão acima citado, consolidando o conceito “intermediário” para fins de definição do conceito de insumos, isto é, insumos para fins de PIS e COFINS não deve ser confundido com o conceito aplicável à legislação do IPI, assim como não deve ser equiparado ao conceito de despesas necessárias disposto na legislação do IRPJ.
A decisão, proferida em sede de recurso repetitivo firmou as seguintes teses: a) É ilegal a disciplina de creditamento prevista nas Instruções Normativas da SRF ns. 247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal como definido nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003; e b) O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte.
Segundo a ministra Regina Helena Costa, redatora do voto com entendimento vencedor do referido precedente, verifica-se a essencialidade de determinado item quando este caracteriza-se como elemento estrutural e inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço, ou, pelo menos, que a sua falta prive tais atividades de qualidade, quantidade e/ou suficiência.
Por outro lado, a relevância seria aferida quando, embora não indispensável à elaboração de produto ou à prestação do serviço, o item integre o processo de produção, seja pela singularidade da cadeia produtiva (e.g., papel da água na agroindústria) ou por imposição legal (e.g., equipamento de proteção individual – EPI).
Neste ponto, não obstante o acórdão proferido pelo E. STJ tenha bem definido os critérios para determinação do que seriam insumos essenciais e relevantes para o processo produtivo e, assim, capazes de gerar direito ao crédito de PIS e COFINS, a mesma decisão afirmou que a análise deverá sempre ser casuística, de modo que o contribuinte deve fazer prova robusta da essencialidade e relevância daquela despesa considerando as peculiaridade de suas atividades. Desta maneira, ao fim ao cabo, não há como evitar a conclusão que, embora definidos os parâmetros, ainda remanesceu um elemento bastante significativo de subjetividade na análise do conceito de insumos para fins de crédito de PIS e COFINS.
De se destacar também que, embora não explicitamente, o acórdão do leading case, deixou mais clara a situação acerca das despesas possíveis de serem consideradas insumos quando considerado o processo produtivo de uma mercadoria, justamente o caso do Contribuinte que lá litigava. Entretanto, embora os critérios sejam os mesmos, não houve um debate ou análise mais intensa em relação aos serviços que possam ser considerados como insumos para prestação de outros serviços.
Pois bem, o acórdão que trazemos à tona trata justamente da aplicação do conceito de insumo em relação aos dispêndios relativos à serviços prestados em favor do Contribuinte que, por sua vez, prestava serviços a terceiros. No acórdão hoje examinado, turma da 3ª Seção do CARF decidiu que “insumo para fins de creditamento do PIS e da COFINS não-cumulativos é todo o custo, despesa ou encargo comprovadamente incorrido na prestação de serviço ou na produção ou fabricação de bem ou produto que seja destinado à venda (critério da essencialidade), e que tenha relação e vínculo com as receitas tributadas (critério relacional), dependendo, para sua identificação, das especificidades de cada segmento econômico.” (Acórdão nº 3401-005.291).
O acórdão em destaque envolvia Contribuinte dedicada às atividades de prestação de serviços de pesquisa e desenvolvimento de produtos. Considerando tais atividades, o Contribuinte tratou de apropriar créditos de PIS e COFINS em relação aos serviços tomados de terceiros relativos a diversos serviços de assessoria e consultoria na área de tecnologia, pesquisa de mercado, análise médica de produtos, entre outros, ou seja, todos estes serviços intermediários à sua atividade-fim.
Entretanto, não obstante a Fiscalização ter reconhecido a essencialidade de tais serviços tomados às atividades realizadas pelo Contribuinte, ainda assim os créditos foram glosados sob o argumento de que tais serviços de assessoria e consultoria se perfectibilizam na “emissão de opiniões verbais/ ou recomendações para prática de determinada conduta ou forma de atuação no mercado”, de modo que, embora tratassem de “serviços necessários, relevantes e essenciais às atividades de inovação do contribuinte” teriam efeitos apenas “indiretos sobre o resultado final” daqueles serviços prestados pelo Contribuinte a terceiros.
Ou seja, por considerar que os efeitos de alguns serviços de assessoria e consultoria na área de inovação terem efeitos apenas “indiretos” no resultado final dos serviços prestados pelo Contribuinte a seus clientes finais, entendeu a Fiscalização que tais serviços não poderiam ser considerados insumos para fins de creditamento de PIS e COFINS no que tange às atividades de Contribuinte prestador de serviços.
Em suas alegações para refutar tal entendimento, apresentou o Contribuinte cópias dos contratos firmados com os seus clientes, documentos estes que atestavam que a atividade principal consistia na realização de “pesquisa e desenvolvimento de produtos, assessoria médica, pesquisa de mercado e registro dos produtos” de determinado setor de atividade econômica. Ou seja, o Contribuinte prestava serviços que ajudavam na inovação e preparação para o mercado consumidor de produtos a serem fabricados e comercializados por terceiros. Para consecução de suas atividades, adquiria de empresas dedicadas à área da tecnologia da informação, médica e demais serviços que serviam de fundamento às atividades-fim realizadas pelo Contribuinte, sendo alguns deles serviços decorrentes das exigências regulatórias aos quais os produtos do cliente do Contribuinte encontravam-se sujeitos.
O fato de os serviços adquiridos de terceiros muitas vezes se resumirem a opiniões por escrito ou verbais que não se “agregariam” ao produto final da prestação de serviços, no entender do CARF não seria um impeditivo ao reconhecimento do direito à apropriação do crédito, pois os serviços de consultoria consistentes na análise de dados mercadológicos, segurança de produtos, formulação de produtos, pesquisa clínica e outros, seriam essenciais e necessários às atividades da Contribuinte, de modo que a apropriação aos créditos de PIS e COFINS deveria ser admitida em relação às referidas despesas. Em outras palavras, sem que tais serviços fossem tomados, a atividade-fim do Contribuinte restaria prejudicada, especialmente considerando os critérios de qualidade e excelência que a indústria à qual seu cliente-final estava inserida.
Por outro lado, em relação aos serviços de marketing e propaganda, entendeu-se que tais serviços não se enquadrariam do conceito de insumos apto a gerar créditos de PIS e COFINS, na medida em que afastados da atividade-fim da empresa Contribuinte, uma prestadora de serviços de pesquisa e desenvolvimento de produtos, ou seja, cujos clientes não são consumidores finais, mas sim fábricas de produtos.
Como conclusão, pode-se afirmar que o acórdão em destaque acaba por reforçar que, não obstante os parâmetros estabelecidos pelo E. STJ no leading case sobre a matéria, ainda assim a análise sobre o conceito de insumos, seja em relação a dispêndios incorridos em bens, seja em serviços, é bastante casuística, devendo o contribuinte ter elementos consistentes, em especial documental, a suportar a aferição da essencialidade e relevância de tais dispêndios para atividade-fim a que se propõe, mesmo que tais dispêndios resultem em apenas pareceres ou recomendações sobre determinadas ações a fazer, exatamente como foi o caso dos serviços de consultoria tomados pelo Contribuinte e reconhecidos como insumos pela Primeira Turma Ordinária da 4ª Câmara da Terceira Seção do CARF.
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THALES STUCKY – Advogado, LL.M. em Tributação Internacional pela New York University e Ex-presidente do Instituto de Estudos Tributários – IET. Sócio de Trench, Rossi e Watanabe Advogados
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