No dia 9 de agosto a Receita Federal divulgou em sua página eletrônica novas orientações a respeito da Lei de Repatriação, por meio do “Perguntas e Respostas”, canal que o fisco vem usando para esclarecer as dúvidas dos contribuintes e, porque não, antecipar sua interpretação a respeito de questões controvertidas da Lei nº 13.254/2016 e da IN RFB 1.627/2016, colocando mais lenha na fogueira com respostas para lá de polêmicas.
Chamou nossa atenção a resposta à pergunta de número “50”, que tem o seguinte teor:
50) No caso de doação a descendente, em data anterior a 31 de dezembro de 2014, de bens adquiridos pelo doador com recursos objeto de evasão de divisas, a adesão ao RERCT deverá ser feita tanto pelo donatário como pelo doador?
A resposta “50” da Receita Federal, em resumo, foi que na hipótese em questão a regularização deverá ser feita pelo doador dos bens, que apresentará a Dercat e efetuará o recolhimento do imposto devido e da multa. Até aqui não vemos nada de errado. Entendemos da mesma forma. O problema a nosso ver está na “nota 1” da resposta dada pela Receita Federal, que diz o seguinte:
Nota 1: Caso o donatário queira se beneficiar dos demais efeitos da lei – penais ou outros – não relacionados exclusivamente à questão tributária, em decorrência de sua conduta, ele deverá aderir ao RERCT.
Segundo a interpretação da Receita Federal, se o donatário quiser se beneficiar da extinção da punibilidade dos crimes que porventura tenha cometido – como, por exemplo, omitir do fisco brasileiro o bem recebido e mantido no exterior – terá ele que fazer a adesão à Lei de Repatriação. Como se sabe, a adesão à Lei de Repatriação depende necessariamente do pagamento do imposto de renda sobre o valor do bem, a título de ganho de capital, à alíquota de 15%, mais multa de mesmo valor. Sem isso, a adesão não tem efeito.Ou seja, segundo a resposta da Receita Federal, o donatário, assim como o doador, terá que pagar o imposto de renda e a multa, calculados sobre o valor do bem, para que seja beneficiado pela Lei de Repatriação. Vale dizer, doador e donatário terão que pagar o imposto e multa sobre o mesmo bem, para que os benefícios se estendam aos dois. Se apenas um deles pagar, o outro ficará exposto aos riscos penais, tributários e administrativos de sua conduta.
Não questionamos a obrigação do doador fazer o pagamento do imposto e da multa, já que se o bem originalmente era dele, e se foi ele quem cometeu o crime de evasão de divisas, ele deve regularizar a situação para se ver livre de problemas futuros. Não concordamos com a obrigação do donatário pagar o imposto de renda, e a razão é muito simples: como é cediço, a legislação tributária prevê como regra a isenção do imposto de renda na hipótese de doação, negócio sujeito ao pagamento do ITCMD – aliás, ao declarar a doação, o contribuinte corre o risco de ser autuado pelo fisco estadual.
A Receita Federal evidentemente sabe da isenção do imposto de renda na doação, mas por meio das “Perguntas e Respostas” induz o donatário a fazer a adesão à Lei de Repatriação – e consequentemente pagar o imposto de renda indevido –, usando o risco penal como pretexto para convencê-lo, sabedor de que este é o fator determinante para a adesão da maioria dos contribuintes que mantêm bens irregularmente no exterior.
O donatário deve sim pagar o imposto sobre os rendimentos porventura decorrentes do bem recebido em doação (alugueis, juros etc.), caso os tenha omitido da Receita Federal. Porém, se for o caso de aderir à Lei de Repatriação para se ver livre de algum crime que tenha em tese cometido, o donatário não deve pagar o imposto de renda a título de ganho de capital, que o fisco exige sobre o valor do bem recebido em doação como condição à adesão, devendo adotar medida judicial para fazer valer o seu direito à isenção.
Por Vinicius de Barros
Fonte: tributario.com.br