Uma das matérias mais controvertidas em relação ao ISS refere-se eleição do local da prestação do serviço para identificação do Município tributante. É o aspecto espacial do fato gerador conjugado com o seu aspecto material, nuclear ou objetivo que irá conferir ao determinado Município a prerrogativa de tributar com exclusividade determinado serviço prestado, nem sempre no âmbito de seu território.
A fim de prevenir conflitos de competência impositiva, o art. 3º da lei complementar nº 116/2003 define com solar clareza o local da prestação do serviços nos seguintes termos:
Art. 3º O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local:
I do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, na hipótese do § 1º do art. 1º desta Lei Complementar;
II da instalação dos andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas, no caso dos serviços descritos no subitem 3.05 da lista anexa;
III da execução da obra, no caso dos serviços descritos no subitem 7.02 e 7.19 da lista anexa;
[…]
XXII do porto, aeroporto, ferroporto, terminal rodoviário, ferroviário ou metroviário, no caso dos serviços descritos pelo item 20 da lista anexa.
1º No caso dos serviços a que se refere o subitem 3.04 da lista anexa, considera-se ocorrido o fato gerador e devido o imposto em cada município em cujo território haja extensão de ferrovia, rodovia, postes, cabos, dutos e condutos de qualquer natureza, objetos de locação, sublocação, arrendamento, direito de passagem ou permissão de uso, compartilhado ou não.
2º No caso dos serviços a que se refere o subitem 22.01 da lista anexa, considera-se ocorrido o fato gerador e devido o imposto em cada município em cujo território haja extensão de rodovia explorada.
3º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no local do estabelecimento prestador nos serviços executados em águas marítimas, excetuados os serviços descritos no subitem 20.01.
Em razão do princípio da territorialidade das normas jurídicas, o local da ocorrência do fato gerador identifica o município tributante.
Ocorre que a Federação Brasileira é composta de mais de 5.550 municípios e os prestadores de serviços (pessoas jurídicas e físicas), apesar de se localizarem no território de um determinado município, salvo em casos raros de sucursais ou filiais em diversas localidades, prestam serviços para tomadores situados nas mais diferentes comunas, inclusive, para clientes localizados no exterior do país.
Logo, se fosse observar o princípio geral de territorialidade das normas tributárias municipais, os contribuintes do ISS, em sua grande maioria, teriam que pagar o imposto em todos os municípios onde fosse prestado o serviço, inviabilizando, por exemplo, o critério da tributação por alíquota fixa dos advogados ou de sociedades por eles formadas, que atuassem nas diferentes comarcas.
Por isso, esse preceito, em perfeita harmonia com o art. 102 [1] do CTN, estabelece uma exceção ao princípio da territorialidade, estabelecendo como regra geral em matéria de ISS, o local do estabelecimento prestador como sendo o local da prestação do serviço, ou seja, o local da ocorrência do fato gerador ou local onde o imposto é devido. A primeira parte desse art. 3º promoveu a substituição ativa do imposto, dando relevância ao local do estabelecimento prestador. A fixação de empresas ou estabelecimentos em determinada cidade é vital para o crescimento e desenvolvimento do município, tanto é que são conhecidos de longa data os tradicionais incentivos tributários concedidos pelo ente político local, com o fito de atrair empresários.
Por meio de ficção jurídica, aquele art. 3º atribuiu a competência tributária ao município em cujo território estiver localizado o estabelecimento prestador do serviço ou, na falta desse estabelecimento, estiver domiciliado o prestador de serviço.
Essa ficção é legítima e constitucional à medida que dirime o conflito de competência entre os municípios, cumprindo a missão outorgada pelo art. 146, I da CF.
Como já foi salientado, o STJ, na vigência do diploma legal anterior, que continha idêntico dispositivo, firmou entendimento de que o local da prestação define o município tributante, não só, em razão do princípio da territorialidade, como também, para evitar a fraude consistente na manutenção apenas formal do estabelecimento no território do município circunvizinho com menor carga tributária.
De fato, na Região Metropolitana de São Paulo inúmeros estabelecimentos de prestadores de serviços, notadamente, empresas de leasing, fugiram do município da Capital para os municípios circunvizinhos, sendo que algumas delas mantêm estabelecimentos praticamente virtuais fora de São Paulo, onde a alíquota é mais elevada, ou seja, de 5%. Mas, isso é problema da fiscalização e não da justiça, que deve aplicar a lei vigente. Não é possível, a pretexto de interpretar a lei, inverter os seus expressos termos.
De qualquer forma, a atual lei de regência nacional do ISS, ao contrário da anterior, que só excepcionava a hipótese de construção civil, estatuiu vinte e duas hipóteses excepcionais de tributação no local da prestação do serviço. Com o veto aos incisos X e XI restaram vinte hipóteses em que o sujeito ativo do imposto será o município em cujo território for prestado o serviço. Os incisos XXIII a XXV acrescidos pela LC nº 157/2016 foram vetados pelo Executivo. O legislador nacional encampou, parcialmente, a jurisprudência do STJ.
Com exceção do inciso XVI, concernente aos serviços de vigilância, segurança e monitoramento de bens e pessoas, que podem ser executados à distância, todos os demais casos excetuados implicam a presença física do prestador do serviço no local de sua execução.
O § 1º, referente aos serviços que se estendem ao longo de diversos municípios (item 3.04), fixa a competência tributária de cada município pelo princípio geral da territorialidade. O fato gerador considera-se ocorrido em cada município, em cujo território haja extensão de ferrovia, rodovia, pontes, cabos, dutos e condutos de qualquer natureza, objetos de locação, sublocação, arrendamento, direito de passagem ou permissão de uso, compartilhado ou não.
Em relação aos serviços de exploração de rodovia pedagiada, o § 2º considera, também, ocorrido o fato gerador em cada município em cujo território haja extensão da rodovia explorada.
E aqui é oportuno esclarecer que continua em vigor os §§ 4º [2], 5º [3] e 6º [4] do art. 9º do Decreto-lei nº 406/68, acrescidos pela Lei Complementar nº 100/1999, que incluiu no rol de serviços tributáveis a exploração de rodovia pedagiada. Sem esses parágrafos, não reproduzidos na nova lei nacional do ISS, a tributação dos serviços de exploração de rodovia teria desaparecido do mundo jurídico, pois o fato gerador do imposto exige a presença da definição legal da Respectiva base de cálculo, sem o que, não se pode considerar instituído o imposto.
[1] Permite que norma de lei complementar confira eficácia extraterritorial às normas tributárias estaduais e municipais.
[2] § 4º Na prestação do serviço a que se refere o item 101 da Lista Anexa, o imposto é calculado sobre a parcela do preço correspondente à proporção direta da parcela da extensão da rodovia explorada, no território do município, ou da metade da extensão de ponte que una os dois municípios.
[3] § 5º A base de cálculo apurado nos termos do parágrafo anterior:
I – é reduzida, nos municípios onde não haja posto de cobrança de pedágio, para sessenta por cento do seu valor;
II – é acrescida, nos municípios onde haja posto de cobrança de pedágio, do complemento necessário à sua integralidade em relação à rodovia explorada.
[4] § 6º Para efeito do disposto nos §§ 4º e 5º, considera-se rodovia explorada o trecho limitado pelos pontos equidistantes entre cada posto de cobrança de pedágio ou entre o mais próximo deles e o ponto inicial ou terminal da rodovia.
Por Kiyoshi Harada
Fonte: tributario.com.br