Recentemente, no mês de outubro deste ano (2018), tivemos a suspensão do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1016605, onde o STF discute se o IPVA deve ser recolhido no local de registro do veiculo ou se no local de domicilio do proprietário.
A CF/88 é clara ao estabelecer, em seu art. 146°, I e III, que somente a lei complementar deve estabelecer as normas gerais em matéria tributária e dispor sobre conflitos de interesse se for o caso. Porem, na esfera federal não temos até o momento nenhum diploma normativo que contemple as regras gerais em matéria de IPVA.
Considerando essa falta de regulamentação por meio de lei complementar, o STF já manifestou entendimento no sentindo de que os Estados podem exercer a competência legislativa plena em relação ao IPVA conforme dispõe o art. 24, § 3°, da CF/1988.
Importante mencionar (e fica aqui a minha indignação) que essa falta de regulamentação pelo legislador complementar acaba gerando altos custos com a maquina pública, que tem manter um judiciário, desde as instancias inferiores até chegar ao STF, para discutir questões como essa que já poderiam ter sido regularizadas. Porem como certos embates envolvem, além dos aspectos técnicos, questões políticas, não adentrarei meus comentários acerca deste tema. (falta de regulamentação)
Voltando ao assunto, o Estado de MG estabelece que inicialmente que o IPVA – incide, anualmente, sobre a propriedade de veículo automotor de qualquer espécie, sujeito a registro, matrícula ou licenciamento no Estado. Porem existe uma ressalva que determina a incidência do imposto caso a propriedade de veículo automotor esteja dispensado de registro, matrícula ou licenciamento no órgão próprio mas o proprietário seja domiciliado no Estado de MG.
Citando outro exemplo, a titulo de analise, temos a legislação do Estado do Rio de Janeiro que prevê de forma expressa que o IPVA tem como fato gerador a propriedade de veículo automotor de qualquer espécie, por proprietário domiciliado ou residente no Estado do Rio de Janeiro ou que esteja sujeito à inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes do Estado do Rio de Janeiro – CADERJ.
Dessa forma podemos observar que os Estados cobram o tributo IPVA, que tem como fato gerador a “propriedade”, do proprietário que esteja domiciliado em seu território independente de onde foi licenciado ou registrado o veiculo. Esse fato gera possibilidade de fraude com contribuintes declarando domicílios em outros estados onde o IPVA é mais barato, ocasionando mais uma “guerra fiscal” entre os estados da federação.
Na votação pelo STF do Recurso Extraordinário (RE) 1016605, o relator, ministro Marco Aurélio, votou a favor do contribuinte, ou seja, pela declaração de inconstitucionalidade da Lei estadual de MG que determina o domicilio do proprietário para efeitos de recolhimento do IPVA. Como parte da justificativa de seu voto destacou que CF/88, em seu art. 158, estabelece a porcentagem de 50% da destinação da receita do imposto ao município onde foi realizado o licenciamento. Seguiram seu voto os ministros Edson Fachin, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello.
Com devida vênia a justificativa mencionada pelo relator, o fato de a Constituição repartir as receitas do IPVA entre o município e o Estado não justifica que tal ato se sobrepõe a competência que está atribuída ao legislador complementar em regular a matéria. A questão da repartição das receitas, conforme posicionados nos votos divergentes, se baseia no fato de redistribuir a receitas de forma a compensar o Estado e município que sofrerão a oneração pela circulação do veiculo.
Conforme previsto o art. 24, § 3°, da Carta Magna, “inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.” Entendimento este já manifestado pela própria corte suprema em outras ocasiões. Logo, os Estados tem a plena liberdade de reger suas particularidades internas concernentes ao IPVA já que não existe as normas gerais que deveriam, em tese, nortear a as características do imposto em questão.
Em sentindo contrario a posição do relator votaram os ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber e Cármen Lúcia. O placar até a suspensão se encontra 5 x 3 favorável ao contribuinte, ou seja o IPVA deve ser cobrado onde foi licenciado o veículo e não onde está domiciliado o proprietário.
Em que pese qualquer uma das teses vencedoras teremos ainda, na pratica, diversas situações que o contribuinte irá a “burla” para reduzir a carga tributária do imposto estadual. Se for considerado o local de registro de licenciamento teremos uma demanda de registro aumentando nos estados onde o IPVA é menos oneroso. Se for considerado o local de domicilio do proprietário teremos contribuintes declarando moradia ou estabelecimento em locais fictícios, como já acontece nos dias de hoje.
Tudo isso porque o legislador complementar não tem motivações suficientes para regular uma questão tão simplória. Não bastasse a altíssima carga tributária existente no Brasil, nós, contribuintes, temos que lidar com inúmeras questões tributárias não regulamentadas que abarrotam o judiciário ano após ano.
Esse caso é apenas mais um, de muitos que passam anos transitando pelo judiciário em busca de uma resposta. E quando chega a Corte maior, depois de longo tempo de espera até entrar em pauta, acabamos tendo teses e posicionamentos que parecem ter o objetivo de confundir ainda mais o já sofrido contribuinte. Diga-se como exemplo a tese da exclusão do ICMS da base das contribuições PIS/COFINS, que até hoje continua trazendo dor de cabeça para tanta gente.
Mediante ao pedido de vista do presidente da Corte, alegando a necessidade de um “estudo” mais aprofundado, a discussão se verá suspensa até a retomada do julgamento. Resta ao contribuinte aguardar, mais uma vez, a morosidade que acompanha o judiciário brasileiro.
AgRg 167.777 /SP e RE 191.703 AgR/SP
Art. 1° e parágrafo único da Lei nº 14.937, de 23 de dezembro de 2003
Art. 1° da Lei nº 2877, de 22 de dezembro de 1997
Fonte: tributario.com.br