O governo está preparando a reforma da previdência enquanto divulga dados alarmantes acerca da situação deficitária da autarquia securitária. Veicula-se na mídia que o INSS está consumindo hoje exatos 42% da receita líquida da União, projetando-se o comprometimento de 87% das receitas líquidas mais para frente, se nada for feito. O quadro é assustador! Se os dados estiverem corretos significa que o governo está operando a máquina estatal com apenas 8% da receita corrente líquida para execução das despesas correntes, sem cogitar das despesas de capital, onde estão compreendidas as despesas de investimentos e as de pagamento dos serviços de dívida. De fato, 42 % para pagamento de benefícios previdenciários, mais os 50% das despesas de pessoal (art. 20 da LRF) perfaz o total 92%, restando apenas 8% para tudo o mais. Isso é crível? É obvio que não! Alguém está exagerando, não se sabe exatamente com que intenção.
A ação concreta do governo, que retira mensalmente 30% da receita previdenciária por meio da DRU, não se compatibiliza com esse discurso da previdência deficitária. A lógica está a recomendar, nesse caso, o aporte de capital, ao invés da subtração mensal de recursos da combalida Previdência Social. Os discursos não casam.
Outrossim, a seguridade social onde está inserida a previdência social juntamente com a assistência social e a saúde tem como fontes de custeios nada menos que seis contribuições sociais (art. 195 da CF) que rendem o dobro da arrecadação dos seis impostos federais. Além disso, a União deve, nos termos da Constituição, contribuir com a sua parte para a seguridade social. Ao que se depreende dos dados veiculados, a União, ao invés de disponibilizar recursos financeiros extraídos da parcela da arrecadação de seus impostos, está, na verdade retirando recursos pertencentes à seguridade social, valendo-se da circunstância de que todas as contribuições sociais passaram a ser arrecadadas pela Secretaria da Receita Federa do Brasil e ultimamente, também pela Secretaria do Tesouro Nacional.
Infelizmente, o exame da Lei Orçamentária Anual que compreende o Orçamento Fiscal da União, o Orçamento de Seguridade Social e o de Investimentos das Estatais não dá a noção exata da efetiva destinação e execução das verbas consignadas para diferentes setores, porque a LOA passou a ser uma peça de ficção, quando deveria ser o instrumento de exercício da cidadania, à medida que representa teoricamente o direcionamento das receitas arrecadadas por meio de tributos por decisão da sociedade, representada pelo Parlamento Nacional.
Autoridades e órgãos passam ao largo das normas orçamentárias violando-as sistematicamente. E essas afrontas às normas orçamentárias só vêm a luz quando convenientes em determinada conjuntura político-institucional..
Seja como for, uma reforma que não parta dos diagnósticos das causas, guiando-se apenas pelos resultados negativos visíveis não terá o condão de sanar os problemas a médio e longo prazos, impondo-se novas reformas cada vez mais drásticas a exemplo das PECs de precatórios judiciais: a 1ª moratória constitucional foi de 8 anos; depois, 10 anos e a última foi 15 anos[1], sem contar os inusitados malefícios acrescentados em cada uma das versões sucessivas. A próxima moratória já em estudo será, certamente, de 20 anos para pagamento com deságio de 70% a 80% do valor original. Aliás, aprovada a PEC 241, teoricamente, o pagamento de precatórios judiciais devem cessar automaticamente no segundo o terceiro ano de sua vigência.
Os discursos veiculados pela mídia têm tudo para os benefícios previdenciários trilharem os mesmos caminhos dos precatórios ditos impagáveis, por conta de décadas de desvios de suas verbas consignadas na LOA. Antes da cultura do calote que tomou conta da administração municipal de São Paulo, que encontrou seu auge nos governos de Marta Suplicy e de Gilberto Kassab, as condenações judiciais eram pagas em três meses.
[1] Apesar de declarada inconstitucional essa última moratória, por força da modulação de efeitos a vigência da EC 62/09 foi prorrogada para vigorar até o ano de 2018. A Emenda é inconstitucional, mas ela continuara regendo os pagamentos de precatórios pelo regime especial, pois nenhuma entidade política poderia cumprir de uma hora para outra os dispositivos permanentes da Constituição que determinam o pagamento de todos os precatórios apresentados até o dia 1º de julho de cada ano e incluídos obrigatoriamente na previsão orçamentária do exercício seguinte.
Por Kiyoshi Harada
Fonte: tributario.com.br