O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), em uma decisão considerada inédita, aceitou a apresentação de bens (máquinas e equipamentos) como garantia por uma empresa em dificuldade financeira para a suspensão de protesto de certidão de dívida ativa (CDA). O entendimento foi adotado após o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhecer, no mês passado, a constitucionalidade do protesto, que é usado por União, Estados e municípios para a recuperação de créditos tributários.
Em regra, os contribuintes com dívidas tributárias protestadas conseguem sustá-las garantindo-as com dinheiro, seguro garantia ou fiança bancária. Porém, o desembargador, Kleber Leyser de Aquino, da 3ª de Câmara Direito Público, ao considerar a atual situação econômica do país e o princípio da preservação da empresa, admitiu a garantia do débito com bens.
A companhia, que atua no setor de tubos, tem uma dívida de cerca de R$ 2,4 milhões de ICMS desde julho de 2015. “Demonstramos que a empresa não é uma devedora contumaz, mas que em consequência de dificuldades financeiras não conseguiu pagar o ICMS nos últimos meses”, diz o advogado da empresa Eduardo Correa da Silva, do Correa Porto Advogados Associados.
De acordo com ele, foi apresentado no processo os resultados da empresa, que emprega centenas de funcionários. “Está documentado o quanto o protesto é danoso para a empresa. Vários fornecedores pararam de cumprir seus contratos em consequência da medida”, afirma.
Na decisão, o desembargador Kleber Leyser de Aquino levou em consideração a situação econômica atual do país e que para a Fazenda Pública do Estado de São Paulo “também é mais interessante a sobrevivência da empresa”. “Entendo que a caução poderá ser efetuada com bens, desde que no valor da dívida inquestionável”, afirma.
Para Correa da Silva, a decisão serve de referência para outros casos de companhias que, em consequência da crise econômica, não teriam outras formas de garantir a dívida. “Além disso, a decisão deixa em aberto. Esses bens podem ser móveis (ativo fixo, por exemplo) ou imóveis”, explica.
Em geral, as câmaras do tribunal paulista tinham o entendimento que esses protestos eram inconstitucionais, segundo o advogado. Para alguns magistrados, tratava-se de um meio coercitivo para a cobrança de um débito, que poderia ser exigido dentro das possibilidades existentes na Lei de Execuções Fiscais.
Porém, com a decisão do Supremo em novembro, a 3ª Câmara de Direito Público do TJ-SP encontrou um meio termo para suspender o protesto em casos específicos, quando demonstrada a dificuldade financeira, segundo Correa da Silva. Até porque a Súmula nº 16 do tribunal estabelece que “insere-se na discrição do juiz a exigência de caução e análise de sua idoneidade para sustação de protesto.”
Apesar de não declarar a suspensão do crédito, a decisão permitiu que a empresa obtivesse a sustação dos protestos e também Certidão Positiva de Débitos com Efeitos de Negativa, com base no Código Tributário Nacional (CTN).
O advogado Maurício Faro, do BMA Advogados, que participou do processo julgado no Supremo, afirma que achou a decisão muito boa “sobretudo pela perspectiva adotada para fundamentar, já que nesse cenário o importante é permitir que as empresas sobrevivam”.
Especialista em direito tributário, o advogado Diogo Ferraz, do Freitas Leite Advogados, afirma que, após a decisão do Supremo, “o mínimo que o Judiciário pode fazer para dar alguma proteção aos contribuintes é garantir meios acessíveis para que o protesto seja suspenso”.
“Independentemente de ser um momento de crise ou não, parece-me um exagero exigir que o contribuinte deposite integralmente o débito em dinheiro para suspender o protesto”, afirma Ferraz. Isso porque, segundo o advogado, o artigo 206 do Código Tributário Nacional e o artigo 11 da Lei de Execuções Fiscais permitem que outros tipos de garantia viabilizem a emissão da certidão de regularidade fiscal e possam suspender o protesto.
A assessoria de imprensa da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) de São Paulo informou por nota que está analisando a íntegra da decisão judicial e, se for o caso, apresentará os recursos cabíveis no prazo legal.
Fonte: Valor Econômico