A existência de registro de marca perante o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) não justifica, por si só, a proteção do direito de utilização do nome em ambientes virtuais, devendo ser avaliadas questões como o ramo de atividade das denominações supostamente em conflito e a existência de alto renome de alguma das marcas.
O entendimento foi adotado pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao negar pedido de cancelamento de registro eletrônico de site por suposto conflito com uma marca de cosméticos. A decisão foi unânime.
A ação originária foi proposta pelas empresas do ramo farmacêutico que alegaram ser titulares da marca Paixão, utilizada para comercialização de linha de perfumaria e cosméticos. Porém, outra companhia já havia feito o registro “www.paixao.com.br”, concedido pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (Fapesp). Sob a alegação de ofensa ao seu direito de propriedade, as requerentes pediram o cancelamento do registro eletrônico do domínio.
Ramos diferentes
O pedido foi julgado improcedente em primeira instância. O juiz entendeu que o registro de domínio virtual não ofendia outros direitos ou marcas registradas com o mesmo nome, pois elas pertenciam a ramos diferentes. A sentença foi confirmada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.
Em recurso especial, as autoras insistiram no argumento de que eram proprietárias da marca Paixão e, dessa forma, tinham direito exclusivo à sua utilização em todo o território nacional. Elas também defenderam o combate à pirataria cibernética, com a repressão da má utilização de nomes ou marcas famosas na web e da venda ou aluguel dos domínios por preços elevados aos titulares dos produtos no mercado.
Exceções à exclusividade
O relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão, explicou que o direito de uso exclusivo da marca não é absoluto, havendo possibilidades de limitação por princípios como o da especialidade. De acordo com esse princípio, regulado pelo artigo 124 da Lei 9.279/96, a exclusividade do uso de sinal distintivo é possível apenas a produtos ou serviços idênticos, tendo em vista a possibilidade de indução do consumidor a erro.
A mesma legislação prevê exceções ao princípio da especialidade, como no caso de marca de alto renome, definida pelo Inpi como aquela reconhecida por ampla parcela do público e de sua flagrante capacidade de atrair os consumidores “em razão de sua simples presença”.
“O reconhecimento administrativo da marca como de alto renome (incumbência conferida, exclusivamente, ao Inpi) assegura-lhe proteção em todos os ramos de atividade e não apenas em relação a produtos idênticos, semelhantes ou afins, afastando, assim, o princípio da especialidade”, disse o ministro.
Sem prejuízo
No caso julgado, o relator entendeu que o registro virtual do nome “paixão” não trouxe prejuízo às empresas detentoras dos produtos cosméticos, já que a atividade do site de internet — aproximação de pessoas para relacionamentos amorosos — não gera confusão para os consumidores.
“Ademais, o referido signo distintivo (‘paixão’) não caracteriza marca de alto renome, a ser protegida em todos os ramos de atividade, o que poderia, em princípio, a depender do caso concreto, justificar a vedação de registro de nome de domínio equivalente. É que tal condição deve ser reconhecida, na via administrativa, pelo Inpi (único órgão competente para tanto), o que não ocorreu”, afirmou o ministro ao lembrar da existência de vários registros do nome “paixão” em segmentos mercadológicos diversos. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Revista Consultor Jurídico, 14 de dezembro de 2016, 7h07